quinta-feira, 31 de julho de 2008

Hilda Hilst


Como se te perdesse, assim te quero.

Como se não te visse (favas douradas

Sob um amarelo) assim te apreendo brusco

Inamovível, e te respiro inteiro


Um arco-íris de ar em águas profundas.


Como se tudo o mais me permitisses,

A mim me fotografo nuns portões de ferro

Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima

No dissoluto de toda despedida.


Como se te perdesse nos trens, nas estações

Ou contornando um círculo de águas

Removente ave, assim te somo a mim:

De redes e de anseios inundada.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Notificação


Ela cansou...
Avisem, por favor, a todos que ela cansou.
Das roupas, das palavras, Deus! Até mesmo dos sorrisos...
Ela está completamente cansada, ficará nua...
Não cobrir ou encobrir nada... Deixará tudo às vistas de todos...
Ficará muda.
Do que adiantam as palavras agora que ela cansou

Do que ela está cansada?
Da busca, da busca incessante que é viver.
Do peso, das toneladas de metros e quilômetros e litros.
E todas as medidas sem sentido que fazem o ser pesar
Ser única? Jamais conseguirá.

Agora ela está parada, na frente do nada.
Fita desafiadoramente o nada
Nem ousa pensar, pensar implica atividade.
Nem mesmo quer não sentir suas ligações cerebrais concebendo seus pensamentos.
Não sentir ou comandar seu corpo mantendo-a viva... Cansou.

Não fará poesia de seu cansaço...
Palavras... Ela está irremediavelmente cansada delas
Não lhe interessa que seu cansaço gere rimas com sentido
Cuidadosamente pontuadas
Instigantes... Perigosas... Ou... Afiadas...

Avisem.